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quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Assunção, 28 e 29 de novembro de 2011

Visual do Seminario que participei em assunção
Esta passagem aqui por Assunção foi puro trabalho. Cheguei ao hotel às duas da manhã de segunda feira e saio as três da manhã desta quarta. Ou seja, apenas 48 horas, com dois dias de trabalho intenso. Ou relativamente intenso. Dei apenas uma palestra de 45 minutos e coordenei um trabalho em grupo de uma hora. Olhando assim é pouco, mas o calor e a dinâmica cansativa e dispersa do trabalho é que geraram cansaço, não o trabalho em si.
Vim aqui para um Seminário sobre Soberania Alimentar e Direito à Alimentação, promovido pela CLOC, sigla de Coordenadora Latino-americana de Organizações do Campo e pela Via Campesina Paraguai. Eu falei sobre Agroecologia e Direito à Alimentação. O assunto é sempre relevante, são mais de um bilhão de pessoas passando fome no mundo, o que strictu sensus é uma ilegalidade, além de uma óbvia imoralidade. Infelizmente permitida e aceita pela sociedade. De alguma forma, por todos nós. Não deveríamos nos acostumar com isto, mas a impotência diante de um problema grave nos faz preferir ignorá-lo, sempre que seja possível. Como a fome atinge os que pouco podem fazer, e os que algo poderiam fazer usam desta estratégia de ignorar o problema, ele se torna crônico. Tudo isto foi discutido nestes dois dias. Por mais repetitiva que sejam estas prosas, não posso achar que sejam desnecessárias.
Já estive em Assunção outras vezes, mas não é uma cidade que entra na lista das minhas favoritas. Acho que o que mais gosto daqui é ver o povo falando Guarani. Mais de 90 por cento dos paraguaios falam Guarani, e uns 40%, a ampla maioria na zona rural, falam apenas guarani. Menos de 10% falam apenas castelhano, quase todos nas cidades maiores. É uma língua oficial aqui desde 1992 e há uns cinco anos é língua oficial também do Mercosul, junto com o português e o castelhano.
Ontem, quando terminou o trabalho, fim da tarde, me levaram para comer e tomar algo em um Bar/Restaurante bastante conhecido aqui chamado Lido. Em frente ao Panteão dos Heróis, no coração da cidade. Estilo tradicional, mesas na calçada, para aproveitar o clima caliente. O prato famoso da casa é um caldo de surubim, mas deixei passar, por causa do calor! Apesar dele, do calor, e de não ter ar condicionado, recomendo. Simpático.
Hoje precisei comprar um transformador para meu computador. Andei pelo centro, caminhei de lá para cá, e adivinha onde achei? Em um shopping de coreanos, que vendem produtos chineses... far cosa? É assim, para todos os lados que viajamos!
Agora arrumando minha mala, nove da noite, em poucas horas saio para o aeroporto. Ate chegar à minha casa, levo quase vinte horas... Que preguiça! A parte boa é ir para casa, depois de doze dias fora. Nem quero pensar que em dez dias tem mais... Saio para Bogotá, em outra viagem meteórica. Vamos ver se de lá tenho algo mais emocionante para contar. 

domingo, 27 de novembro de 2011

Lima, 27 de novembro de 2011.

Lima, vista do hotel
Domingo, e eu estou aqui no avião em direção à Sampa, de onde pego o voo para Assunção. Numa boa, voando sobre a cordilheira dos andes, com direito a ver o Titicaca. Lindo. Enorme, com muitas ilhas, um azul intenso em sua maior parte, que se transborda para verde em algumas de suas margens. Rodeado por algumas cidades, que do alto não parecem muito pequenas. Pretendo vir a uma delas em algum momento. E passear pelo Titicaca, ver de perto a cultura deste povo do lago, sua curiosa e avançada cultura náutica.
Valeu a pena ter feito esta parada entre La Paz e Assunção. Basicamente troquei doze horas de aeroporto no Peru mais quinze no de Guarulhos, que era o previsto no itinerário inicial, por passar um dia em Lima. Claro, isto teve um custo a mais, mas sem duvida muito melhor.
Estava cansado depois de uma semana de intenso trabalho e assim fiquei a maior parte do tempo no quarto do hotel. Mas isto não me impediu de fazer o que mais gosto aqui em Lima, que é passear por Miraflores. Para quem já leu Mario Vargas Llosa, este é um bairro citado em vários dos seus livros. Ele talvez seja o mais ilustre dos miraflorinos.
Praça Kennedy, Miraflores, Lima
Para começar meu passeio fui para a Praça Kennedy, a central de Miraflores. Particularmente movimentada no sábado. Famílias passeando, leitura de livros infantis feitas por animadores, show de palhaços, baile da terceira idade, barraquinhas de comida, feira de artesanato. Me chamou a atenção dezenas de gatos pelo parque, brincando em suas árvores, se sentindo absolutamente senhores do espaço. Intuo que eles ainda vão dar trabalho...
Depois caminhei em direção ao Parque do Amor, que fica no meio no calçadão que bordeia o Pacifico pelo alto. Digo pelo alto porque ele está sobre uma falésia, a poucos metros da praia, e é no alto desta falésia que esta a calcada, a rua o bairro. Do Parque do Amor fui pelo mesmo calçadão para o Larcomar, um centro comercial construído incrustrado na parte superior desta falésia, tendo o pacifico a seus pés. Se me faço entender, de todas as lojas, cafés, restaurantes e corredores deste centro comercial estamos vendo o oceano. E me organizei para estar aí no por do sol. Espetacular o sol se pondo no mar, o que apenas podemos ver em lugares muito específicos no Brasil. Não resisti e tomei uma Cusquenha, uma das cervejas nacionais, vendo este visual. Pena que não tenho fotos, saí sem câmara, queria mesmo caminhar o mais tranquilo possível.
Depois deste passeio e deste visual não precisava mais nada e no inicio da noite fui caminhando para o quarto do hotel e não saí mais. Recuperando energias, hoje passo entre aviões e aeroportos. Amanhã já estou no trampo o dia todo, em Assunção, um evento sobre Soberania Alimentar, organizado pela CONAMURI, organização de mulheres indígenas do Paraguai. No fim do dia, conto como foi. Por agora vou aproveitar que o Titicaca nos deixou e relaxar, ouvindo música e vendo um pouco mais da Cordilheira dos Andes.

sábado, 26 de novembro de 2011

La Paz, 25 de novembro de 2011

Grupo do Encontro do Foro latinoamericano de SPGs
          Ontem e hoje foram dias intensos de trabalho. Entre discussões em grupos e suas conclusões e algumas visitas. Uma destas visitas foi a uma cooperativa de produtores de cacau ecológico, chamada El Ceibo (http://www.elceibo.org/ceibo/es/index.php). Vale a pena olhar o site deles. Produzem de forma ecológica, são organizados em cooperativa, fazem um chocolate de excelente qualidade e vendem no mercado interno cerca de 60% do que produzem. Sem dúvida um dos melhores exemplos que temos no continente, tiro meu chapéu para eles.
                No fim da tarde de hoje terminamos o evento. Com um ato político, no qual apareceu o Vice -Ministro da Coca e do Desenvolvimento Integral. Sei que o nome soa meio estranho, mas é isto mesmo, aqui existe um Ministério da Coca. O atual presidente, Evo Morales, é um cocaleiro, o que significa um agricultor que tradicionalmente colhe coca e vive disto. Uma das suas atitudes no governo é liderar uma campanha internacional pela descriminalização da coca. Da coca, não da cocaína, só para deixar claro. O Ministério da Coca, criado por ele, se insere neste contexto.
Término do evento, Ministro da
Coca falando.
E depois das ultima palavras, proferidas pelo Ministro, fotos, abraços e as despedidas de praxe. Eu feliz, o Encontro foi muito bom, e como eu trabalhei nele desde sua gestação, me senti aliviado e com a sensação de serviço feito. Done.
Acabou e ainda era dia, um grupo foi para Sagárnaga, uma das ruas que forma o que aqui eles chamam de Mercado de las Brujas, que eu contei aqui que visitei domingo passado. Não compro nada, é tudo meio repetitivo para quem como eu sempre anda pelo continente, mas gosto de passear, ver, e hoje ainda serviu como um belo relaxante. De novo voltei caminhado para o hotel, e já no final da minha semana aqui persiste a impressão de uma cidade tumultuada, transito impossível, muita gente. Não achei muito agradável não. Como já disse aqui, a melhor parte é o Illimani, que vela por La Paz e ainda a embeleza. Fica a vontade de conhecer mais o país, visitar o Lago Titicaca o lago navegável comercialmente mais alto do mundo e o Salar de Uyuni, a maior planície salgada do mundo. Desta vez não deu.
De noite, me arrastaram para ver um show. Eu estava cansado, afim de arrumar mala e dormir. Mas fui com a intenção de ficar meia hora para cumprir tabela, fiquei quase três. É que o show do cara é muito bom. Pela música, mas principalmente pela sua interação com o publico de diversos países, já que é um lugar bem conhecido por aqui. O lugar chama Marka Tambo, e fica na Calle Jaén, por sinal a mais bonita que vi na cidade, estreita, colonial, bem conservada. O cantor, um figuraça, se chama Pepe Murillo (www.pepemurillo.com).
Agora estou aqui, uma da manhã, arrumando mala para sair às seis do hotel. Como domingo à noite tenho que ir para Assunção, e minha passagem é por Lima, resolvi que vou dormir lá amanhã. Melhor que dormir no avião e passar todo o dia em Sampa, que era o plano inicial. Dois amigos de trabalho, suecos, estão indo para Lima, e ainda vamos arrumar tempo para nos reunirmos por lá. E claro, comer um ceviche. Vou deitar, tenho menos de cinco horas para já estar no táxi a caminho do aeroporto.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

La Paz, 23 de novembro de 2011

Eu, Illimani ao fundo

Me encontro agora no quarto do meu quarto hotel desta semana! É bom, deixa a semana movimentada. É que o hotel que estávamos, em Achocalla, era realmente frio e desconfortável. Como amanhã viríamos todos para La Paz, antecipamos para virmos hoje. Um pouco confuso, um grupo agora de 50 pessoas, mas beleza, estamos todos bem abrigados agora.
O dia foi de trabalho. Pela manhã apresentações de alguns países, mas principalmente da Bolívia. Ou do Estado Plurinacional da Bolívia, como eles gostam de dizer, já que a nova constituição, aprovada há alguns anos, reconhece mais de 30 nacionalidades diferentes no País. Nas apresentações e conversas de corredores podem ser percebidas as mesmas contradições de outras partes, com um estado eleito para representar os interesses das camadas mais populares se vendo em dificuldade em cumprir suas promessas. Acho eu que estas dificuldades podem vir da ignorância, da má fé ou de uma releitura da realidade depois de chegar ao poder. Mais possivelmente uma mescla dos três.
Produtoras de hortaliças
De tarde saímos para fazer umas visitas, mas confesso que não foram nada especiais. Fomos ver algumas das iniciativas que tentam justificar o adjetivo de ecológico para o município de Achocalla. Pequenas estufas de hortaliças, uma fábrica de queijo, uma escola alternativa. Interessantes, mas acho que demora um pouco ainda para a cidade fazer jus ao apelido...
Durante todo o tempo, nestas visitas, éramos observados pelos montes nevados. Hoje fazia sol pela tarde e o Illimani e o Murorata estavam radiantes. O Illimani é o principal monte nevado aqui da região de La Paz. Segundo a cultura local estes montes são ‘apus’, nome Quechua para Deuses. 
Murorata, que em Quechua significa a descabeçada
Eles são os responsáveis por manter a integridade do Território e dos seus habitantes, não apenas os seres humanos, mas de todas as suas formas vivas. Os habitantes de um povoado ou cidade costumavam fazer suas oferendas a estes montes. Esta tradição ainda se mantém em boa medida, segundo me informaram. Achei interessante que eu também fiquei com vontade de fazer minha reverência à eles. De verdade. Como não sei fazer um ritual para um ‘apu’ e tampouco costumo fazer o sinal da cruz, que acho até que seria válido nesta situação, me limitei a admirá-los.
Amanhã continua a lida, uma breve visita pela manhã a uma fábrica de chocolates orgânicos, depois a uma feira de produtos locais e então mais trabalho em sala. Entre um e outro, trocar outra vez de hotel. Dia cheio, e estou cansado. Fui.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

La Paz, 22 de novembro de 2011

Cerimonia à Pachamama

Como previsto, dormir não foi uma tarefa fácil. Muito frio no quarto. E a grossura do colchão me fazia sentir o estrado. Deve ser bom para a coluna. Fui dormindo, acordando de tempo em tempo. Às seis, já dia, me levantei. Tomei um banho. A água só morninha, mas o ambiente tão frio que aqueles poucos filetes de água que caiam serviam como uma espécie de abrigo. Às seis e meia saí do quarto. Encontrei um agricultor, que está conosco e lhe perguntei como dormiu. Bem, ele disse, silencio, não faz tanto frio. Viu? Tudo é uma questão de perspectiva...
Enfim, sobrevivi, mas para esta noite acabei optando por me refugiar em La Paz. Foram 40 minutos para chegar ao hotel que estou, mas quarto e banho quente não têm preço nem distância!
Ainda mais porque para completar a noite difícil, choveu muito durante o dia e o frio aumentou. Com o templo nublado, o mais legal do lugar do evento que é o visual dos picos nevados se foi. Cada um tem o que merece...
Começamos o evento hoje com um culto à Pachamama. Um agricultor local nos ajudou, armou a fogueira, as oferendas, ateou fogo e cada representante das delegações dos diferentes países ateou um pouco de álcool ao fogo, desejando que tenhamos um bom seminário e voltemos todos bem aos nossos lares. Para quem não é desta cultura, pode parecer meio estranho. Mas se eles fossem católicos fariam uma missa, se fossem luteranos um culto, se fossem espíritas uma prece aos benfeitores espirituais... Cada um na sua onda!
Depois desta cerimonia de abertura, passamos o dia ouvindo a experiência de diferentes países sobre Sistemas Participativos de Garantia. Nesta primeira parte do evento estão cerca de 80 pessoas, oriundas de cerca de quinze países, a maioria latino-americana. Ouvir experiências sobre SPG significa ouvir sobre trabalhos com produção ecológica, circuitos curtos de comercialização, agrobiodiversidade, respeito às culturas locais. Com um desfilar tão vasto de experiências interessantes, em lugares diferentes e volumes consideráveis, é inevitável que nos invada uma onda de esperança... que seja eterna enquanto dure!
Amanhã pela manhã seguimos com o relato de experiências, na parte da tarde tem saída a campo, o que é sempre muito válido, pela oportunidade de ver um pouco da realidade local. Vou dormir, aproveitar meu quarto de hotel.

La Paz, 21 de novembro de 2011

Plaza Murillo
Estou aqui em La Paz para um evento sobre Sistemas Participativos de Garantia (SPG). Um pouco diferente esta viagem, porque neste caso não estou como convidado, mas sim como um dos organizadores do evento. Isto porque coordeno uma articulação que chamamos Foro Latino-americano de SPGs. E aqui, na Bolívia, está uma das organizações membros deste Foro, a Associação de Organizações de Produtores Ecológicos de Bolívia (AOPEB). Passei os últimos meses preparando este evento, junto com o pessoal daqui. Viva a internet!
Acordei muito melhor hoje do mal de altura. Como me disseram, 24 horas são suficientes para se adaptar. Claro, estou andando devagar, não exagerando na comida, já que a digestão se põe mais lenta. Mas no geral, estou bem.
De manhã trabalhei no meu quarto, mas ainda pude encontrar um tempo para passear um pouco pela cidade. Peguei um táxi, que aqui são baratos, e fui a Plaza Murillo, a principal de La Paz. Como principal sempre devemos entender estas praças estilo medieval, secas, cercada pela Igreja, pelo poder político (neste caso a Assembleia Legislativa) e pelo comércio. Os três poderes. Eu poderia acrescentar um quarto poder, que são os pombos. Atraídos pela comida farta, vendida por ambulantes para crianças e adultos, tomaram a praça para eles. Não sei se é falta de sensibilidade minha, mas os tais pombinhos, às centenas, deixam o espaço menos agradável.

Feira em La Paz
Depois de comer em um restaurante local, com quatro amigos que estão aqui para o evento, um Boliviano, um Sueco, uma da Malásia e um da Tanzânia, ainda fomos visitar uma feira de rua, bem legal. Variedade de tubérculos  chás, condimentos  folhosas. No meio da tarde nos buscaram no hotel para irmos ao local do evento, onde estou agora. Uma cidadezinha pequena, 40 minutos de La Paz, chamada Achocalla, com uma altitude semelhante à de La Paz. Um hotel bem modesto. Peninha, eu estava como um rei no outro hotel. Não me queixo da falta de frigobar, TV ou internet, mas sim me faz falta um aquecedor no quarto e um banho quente. 
Monte nevado Potosi
O chuveiro elétrico é absolutamente impotente diante de uma água que desce dos paramos nevados a mais de 5000 metros de altitude. Mas isto do banho eu só confiro amanhã, hoje passo, já tomei o do dia.             Para compensar, o local é muito tranquilo, meio rural, com o mesmo visual interessante de montanhas secas, sendo algumas delas com picos nevados. Muitos chegam hoje, outros chegam ainda nesta madrugada. Mais uma vez o prazer de rever amigos e conhecidos de diferentes lugares do continente. Amanhã, a primeira palestra é minha, além de ter que fazer toda a moderação do evento. Melhor dormir. Ou tentar, sinto que neste frio, com este colchonete sobre o estrado, dormir vai ser uma tarefa difícil.

La Paz, 20 de novembro de 2011

Loja de artesanato, Mercado de las Brujas
Cheguei nesta madrugada em La Paz, duas da manhã eu já estava no hotel. Bem localizado, centro da cidade.
O aeroporto fica na cidade de El Alto. Altitude de pouco mais de 4000 metros. Daí fomos para La Paz, que fica a uma altitude média de 3700m. Média porque a cidade é tão cheia de ladeiras, que a altitude pode variar muito de um local a outro. É um cidade não muito grande, pouco mais de um milhão de habitantes, tumultuada e desorganizada como a maioria das capitais latino-americanas. Muitos dos seus bairros periféricos estão incrustados nas  montanhas, bastante íngremes, e rodeados por montanhas ainda mais altas, pedregosas, sem vegetação. O toque de beleza fica pelos montes nevados que se destacam quando as nuvens permitem.
E aí, com esta altura toda, adivinha? Estou com o mal das alturas, ou sorocho, como eles chamam por aqui. Passei mal o dia todo. Os sintomas são dor de cabeça e mal-estar. A medicação indicada, chá de folha de coca. Tomei vários e não adiantou muito. O que me ajudou foi uma bala de coca, que comprei no Museu da Coca, um dos poucos lugares que visitei, em três horas de caminhada, as únicas que passei fora do meu quarto de hotel. O Museu fica no chamado Mercado de las Brujas que é um conjunto de ruas estreitas e inclinadas, onde pequenas lojas e ambulantes vendem artesanatos e algumas das oferendas usadas em seus rituais para a Pachamama ou Madre Tierra. Acho que posso dizer que a Pachamama é como a principal divindade da cultura Ayamara, que é a predominante por aqui. Dentre estas oferendas a que mais chama a atenção são os fetos de llama, que junto com as Alpacas e Vicunhas formam a tríade de Camelídeos característicos dos Andes. Eles são vendidos fossilizados, e eu não fiquei com vontade de comprar um não... quem sabe uso uma foto em minha oferenda...
Vista da janela do hotel, morros de La Paz
Voltando ao Museu, ali aprendi a importância da Coca para estes povos que habitam a Cordilheira dos Andes. Viver na altura não é moleza não. Por mais que os nascidos aqui possam se adaptar, a altitude, o relevo e o frio tornam mais difíceis as tarefas cotidianas e, porque não dizer, a própria vida. A coca é como um elemento muito importante para ajudar nesta adaptação. Normalmente o hotel ou o local que estiver te esperando te vai oferecer chá de coca ou folhas para serem mascadas. É possível comprar as folhas secas facilmente de ambulantes nas ruas. E elas devem ser colocadas na boca e levemente mascadas, formando um macerado que deve ficar entre a gengiva e a bochecha, facilitando a absorção da cocaína, um dos muitos alcaloides da coca. Calma gente... esta absorção é em doses absolutamente pequenas. Mas já serve como estimulante por um lado e anestésico por outro. E é isto que é usado por aqui há milênios, como eu disse para deixarem mais digeríveis as atividades diárias ou como apoio nos seus rituais. O fato de um ocidental ter isolado a cocaína, ela ter começado a ser usada em vinhos, refrigerantes ou remédios, depois ter virado droga e ser proibida é uma pequena parte da história da coca e tem apenas 150 anos.
Bom, amanhã conto mais da cidade. Hoje foi dia mais de hotel. E agora, vou me recolher. São ainda nove horas, mas me sinto acabado. E a semana será longa, o trabalho intenso.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Costa Rica, 07 de novembro de 2011

Isla de las Tortugas, Costa Rica
Ontem cheguei cansadíssimo, quase dez da noite, e nem tive vontade de escrever, o que é raro. Passei o dia todo entre viagem e praia. Como depois de uma semana de trabalho estava cansado, decidi não alugar carro e viajar sábado e domingo e sim contratar uma excursão para a Isla de las tortugas. É bom às vezes pegar estas excursões para me lembrar de que não gosto. Passar de hotel em hotel, parar em lugares de compras desnecessários, fazer tudo junto com desconhecidos... não é minha praia. Mas a praia que fui ontem sim, entra para a lista de minhas praias. Paradisíaca.

Canto da Isla
A Isla de las tortugas é um das mais de dez ilhas do Golfo de Nicoya, que fica no pacífico norte da Costa Rica, e se caracteriza por uma vegetação de bosque tropical, que chega praticamente até o mar. Sair da água, passar por 20 metros de areia branca e já estar em uma floresta é sensacional. Fiquei alternando entre mar, sol na areia e sombra na floresta. Como não conhecia ninguém, me fiz acompanhar de uma Imperial, a cerveja mais tradicional da Costa Rica. Ela ajudou bem a compor o cenário da ilha e do meu domingo de relaxamento.

Entre ir e voltar, 3 horas em um catamarã. Musiquinha caribenha, sol, mar, bebidinhas e comidinhas a bordo. Que mais? Mais nada, tá bom assim.

Restaurante na Isla
Valeu muito, o local é lindo, compensou o desgaste das 5 horas de ônibus. Mas dá próxima, fico com a ilha e deixo a excursão!

Este foi meu domingo, agora, já segunda de manhã, para me despedir, vim escrever aqui do jardim do hotel. Já comentei que é lindo, e chega a ser uma atração turística, com pessoas locais ou hóspedes de outros hotéis vindo visitá-lo. E os caras ainda tiveram a sacada de meter sinal de internet em uma parte do jardim, que é onde estou agora. Flores para todos os lados, sol, vento soprando baixo, temperatura agradável. Com o computador na mão achei Marisa Gatamansa cantando “Viagem”. Óh, poesia me ajude, vou colher avencas, lírios, rosas, dálias...

O jardim e a musica me trazem uma doce melancolia. Acho que são os 15 dias longe dos meus, das minhas coisas, do meu cotidiano. Viver com asas é bom, mas as raízes fazem uma falta...

Daqui a pouco saio para o aeroporto, meu amigo Manuel Amador me leva. Passo por Lima e de lá pego um voo direto para Porto Alegre. Não ter que passar por São Paulo, o que é raro, torna a viagem muito mais digerível. Bom, vou nessa, acabar de arrumar malas. A próxima é La Paz, no final do mês.

Orquídeas, Jardim do hotel
Heliconea, Jardim do hotel

domingo, 6 de novembro de 2011

Costa Rica, 05 de novembro de 2011

Feria Verde - San José

Ontem foi um dia cheio de trabalho, que ainda se estendeu até hoje ao meio-dia, já que terminamos o curso com uma visita a duas feiras de produtos ecológicos que acontecem em San Jose aos sábados pela manhã. Uma se chama “El Trueque” e a outra “Feria Verde”. Estilos diferentes, mas as duas são interessantes, ainda que modestas para o que estamos acostumados a ver em alguns lugares do Brasil.
Feria El Trueque, San José
Esta primeira feira, El Trueque, eu possivelmente a tenha visitado umas seis vezes desde que foi criada, há uns dez anos. Continua muito parecida com o que era no início. Posso estar equivocado, mas acho que é um quadro que já vi em outros lugares. Os agricultores que inauguram a Feira acabam se apoderando dela, dificultando a entrada de novos membros. Normalmente as justificativas são relativas a preocupação com a qualidade orgânica dos produtos, mas a real é o receio de dividir um espaço privilegiado de comercialização, imaginando que isto poderia diminuir suas vendas. Pena, mas de certa forma óbvio, quase natural. A solução é que alguma força externa, como uma ONG ou o poder público, tensione para quebrar este compreensível sentido de corpo dos agricultores.
Depois das despedidas de praxe, busquei um lugar para ir que pudesse me ajudar a fugir do sentimento de vazio que fica quando ficamos sozinhos depois de uma semana envolvido com um grupo. Já estou acostumado, mas até por isto uso estes antídotos.
Escolhi o centro de San José, que na real não é muito atraente. Mas tinha gente, que era o que eu buscava. Fui ao Mercado Central, sempre gosto destes mercados, mas confesso que às vezes os produtos chineses junto a artesanatos e comida de baixa qualidade descaracterizam um pouco estes espaços.  Este é, ao menos em parte, o caso do de San José.
Bar/Soda Chelles - San José
Depois de caminhar por um centro de cidade lotado e pouco interessante, fui buscar um lugar para comer. A primeira opção era o Pátio do Balmoral, estilo mais internacional, amplo, bonito e agradável apesar de estar no meio do tumulto. A segunda era o Chelles, um bar/restaurante pequeno, tipo popular, antigo, inaugurado em 1909, meio decadente, mas ainda com bonitos móveis de madeira. Adivinha qual escolhi? O Chelles. Queria comer algo costarriquense e tenho a tendência a achar que os restaurantes internacionais pasteurizam um pouco o sabor da comida regional. Os mais locais tem uma tendência a manter as características de sabor dos pratos. Comi um casado, prato típico daqui, com arroz, feijão, bife, banana frita e salada. Bom. Só bom.
Casado, prato típico costaricense
Cheguei ao hotel no meio da tarde, ainda em tempo de ver o Botafogo perder do Figueirense. Eu mereço! Acompanhado de um chocolate com pimenta, sem leite e soja, 70% cacau, biodinâmico. Eu mereço.
Para terminar o dia e de certa forma a semana, já que hoje terminou o trabalho, fui tomar algo na casa do coordenador da instituição que me convidou para estar aqui. Voltei cedo, às onze, mas tarde para quem amanhã sai às cinco e meia do hotel. Tenho passeio de barco e banho de mar no pacífico. Show né?

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Costa Rica, 03 de novembro de 2011.

Aula sobre Agricultura Orgânica.

Para cantar nada era longe, tudo tão bom. Até a estrada de terra, na boleia de um caminhão.
Mais um dia muito legal de ida ao campo. Hoje fomos visitar a propriedade Los bobos, da família de Minor e Jeannte, que fica no cantão de Aserri, província de San Jose. Levamos mais de duas horas para chegar. A última parte do trajeto fizemos na boleia de um caminhão, em uma estrada que alternava subidas e descidas fortes, muitas vezes costeando, com não mais que um metro distancia, o rio ou o precipício. Bonito, divertido, emocionante. Mas talvez desnecessariamente perigoso.
Na boleia do caminhão
A propriedade fica entre altas montanhas, e vai de 800 até 1300 metros de altitude. Significa que ela é excelente para o Café, um dos seus cultivos principais. Esta é a região de Tarrazu, uma das mais famosas do mundo para café, pelos seus solos vulcânicos e por seu balanço entre latitude e altitude, o que significa alta insolação e temperaturas amenas. Nesta zona, 1200 metros de altitude são considerados ideais. Mais alto, o café pode ganhar em acidez e corpo, mas perde em leveza e aroma. Mais baixo, ao contrário, se torna mais suave e aromático, menos encorpado e ácido.
Café sombreado de Tarrazu
Depois de visitar o cafezal, ouvimos uma bela aula sobre a história com agricultura orgânica da família, que fez esta opção por preocupações ambientais e problemas de saúde. Almoçamos e fizemos o bonito e perigoso caminho de volta para ir visitar a fábrica de adubos da AFAORCA, associação à qual a família pertence. Significa Associação de Famílias Produtoras Orgânicas de Caraiagres, que é o nome de uma das montanhas da região. 
Por último, ainda tivemos o privilégio de ir à cafeteria da própria associação. Bonita, simples, de madeira, construída no alto de um morro, tendo um profundo vale como testemunha. Excelente café. A torradeira da AFAORCA fica no andar de baixo, o que faz com que o cheiro de café diga presente todo o tempo. Quem trabalha nela são os filhos dos sócios. Show de bola.
Cansativo, doze horas entre ir e voltar, mas muito legal. No nosso meio, da Agricultura Orgânica, sempre temos a preocupação de incorporar estas visitas na programação dos cursos. Ver a realidade concreta de quem está vivenciando a AO e permitir o intercambio de conhecimentos.  Afinal, segundo o poeta cantor, todo artista deve ir aonde o povo está.
De noite uma janta com alguns amigos. Comemos chicharones (normalmente torresmo, mas às vezes, como hoje, vem misturado com carne de porco frita) e aipim frito acompanhado de uma Imperial gelada. Boa a janta, muito bom o dia.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Costa Rica, 02 de novembro de 2011.

Visual na estrada de Heredia para Zarcero, Costa Rica

Aqui na Costa Rica existe o dia de finados, mas não é feriado. Conclusão: O maior feriado no Brasil e o bonitão aqui trabalhando... bom, trabalhando força de expressão, porque hoje foi dia de visita de campo. Adoro as metodologias participativas, tipo cada um apresentar sua experiência ou trabalho de grupo, ou dia de campo nos cursos que dou. Me sinto ganhando sem trabalhar! Saí do hotel hoje às sete da manhã, depois de acordar as quatro, ficar no computador até as seis e ainda dar uma volta pelo belo jardim do hotel.
Fomos para o interior de Zarcero, cidade da Cordilheira Central do país. Cordilheira vulcânica, que está em todo o centro da Costa Rica. De um lado da cordilheira o Oceano Atlântico, do outro o Pacífico. Como diz um amigo meu daqui, um país de praia e vulcões! Por falar nisto, hoje teve um tremor em Guanacaste, praia do pacífico norte, de 5,7 graus... Chegou até onde estávamos, levemente... aiaiai... A viagem foi bonita, por estradas apertadas, sem acostamento, curvas intensas, subidas e descidas fortes, oscilando ao redor dos dois mil metros de altitude.
APODAR - Zarcero, Costa Rica
A visita foi em uma Associação de Agricultores Orgânicos chamada APODAR. Eles têm mais de 20 anos de trabalho, principalmente com hortaliças orgânicas. Hoje, depois de todo este tempo, são um grupo de 10 famílias, bem estruturas na produção, em sua organização e no mercado. Como principais produtores de hortaliças orgânicas da Costa Rica, vendem para as principais cadeias de supermercados do país. Possuem um centro de recebimento, armazenamento, embalagem e distribuição dos seus produtos.
Ainda tivemos tempo de visitar seus espaços de produção de adubo orgânico. Um mais caseiro, em uma propriedade, mas com alta dose de informação por parte do produtor. Outro maior, mais estilo de uma fábrica de adubos orgânicos, que uma Cooperativa local mantém. Esquema bom, profissional, podemos notar que a Agricultura Orgânica chegou na região, ficou, vem se expandindo e só vai ter mais e mais presença na vida da população local. Excelente exemplo!
Amanhã seguem as visitas à campo, no final do dia devo fazer um fechamento destes dois dias de visita. Arrisco dizer que não vai dar tempo. Estas visitas costumam demorar mais do que o acordado. O bom é que vou visitar café, produção e processamento. Adoro!

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Costa Rica, 01 de novembro de 2011.


Curso de Agroecologia, Hotel Cibeles, Heredia, Costa Rica
Hoje já é terça-feira e nem parece que cheguei à Costa Rica ainda no domingo pela noite, depois de uma viagem tranquila desde Quito. O tempo voou. Nem cheguei tão cansado pela semana que passei no Equador, mas um pouco preocupado pela semana que tinha e ainda terei pela frente. O bom é que o mais pesado do curso pelo qual estou aqui passou. Ontem e hoje era comigo todo o tempo, nove horas por dia, mas agora teremos quarta e quinta de visita a campo, onde mesmo que eu siga trabalhando é sempre menos tenso e mais agradável que dar aula durante todo o dia.
O grupo é grande e diverso, o que complica a vida do professor, mas torna o desafio mais estimulante. Muitas vezes sou obrigado a falar a mesma coisa de diferentes maneiras. São 54 pessoas, a maioria agrônomos e lideranças de movimentos sociais ou dirigentes de cooperativas e associações. Nicarágua, Guatemala, Honduras, El Salvador e Costa Rica. Chama a atenção serem mais mulheres do que homens, isto não é normal nos espaços onde circulo.
Momento de intercâmbio de experiências no curso
Estou aqui à convite de duas ONGs. CEDECO, aqui da Costa Rica, velha conhecida, e o Centro Cooperativo Sueco (CCS), ONG de Cooperação Internacional, com sede na Suécia. O CCS tem presença, ou seja, projetos executados com seus recursos, nestes cinco países da América Central e está fazendo da Agroecologia um dos seus eixos de atuação. Este curso é como uma etapa para “colocar o tema sobre a mesa”, como eles me disseram. Ontem e hoje trabalhei o que pode ser chamado do aspecto mais técnico da agroecologia, manejo de solo, proteção das plantas e tal, amanhã e depois vamos ver experiências práticas, sexta mudança climática pela manhã e comercialização de produtos ecológicos pela tarde. Terminamos sábado em uma Feira de Produtos Ecológicos. Tá tudo bem, não me queixo, eu gosto de fazer este tipo de trabalho.
Estou em Heredia, cidade vizinha à capital, San José. Em um hotel chamado Boungainvillea, que tem a minha medida. Boa cama, bom quarto, bom café da manhã, e principalmente, um jardim sensacional, com dezenas de espécies de orquídeas, bromélias, helicôneas, rãs, pássaros, borboletas. Possivelmente duendes e fadas, mas parecem que não querem aparecer para mim, devo estar me comportando mal com eles.
Já estou meio cansado de estar longe de casa, saudades dos meus. Esta viagem para cá emendou com Equador, que já tinha sido pouco tempo depois de Coréia e China. Ossos do ofício. Por outro lado, trabalho que gosto de fazer, bom hotel, revendo bons amigos, sendo bem tratado. Filés do ofício.
Amanhã saio às sete da manhã, melhor dormir.